Esta é uma pergunta recorrente nos consultórios médicos e dúvida também de muitos leitores do site, por isso resolvemos abordar este tema de forma clara e abrangente, para que todos possam compreender os desafios que se colocam para a recuperação de uma pessoa que sofre de esquizofrenia.

Não se trata somente da escolha de um antipsicótico eficaz e bem tolerado, mas de uma constelação de fatores que vão desde a precocidade do diagnóstico e do tratamento até a escolha dos tratamentos psicossociais, como a psicoeducação de família, psicoterapia e terapias de reabilitação.

Um ponto central é o tempo para o diagnóstico e para um tratamento que seja capaz de trazer o paciente para um estado de remissão (sem sintomas positivos) o mais rapidamente possível.

Pesquisas mostram que um paciente com esquizofrenia é levado a um psiquiatra em média após 1 ano de doença, quando já sofre dos sintomas positivos, como delírios e alucinações. Geralmente o paciente apresenta também, algum tempo antes do primeiro surto, sintomas negativos, como apatia, desânimo e isolamento, e sintomas cognitivos, como problemas de memória e concentração, que prejudicam as suas atividades produtivas, como trabalho e estudo, muitas vezes descontinuando-as algum tempo antes. Esses sintomas raramente são atribuídos à doença e dificilmente o paciente é levado ao psiquiatra apenas por essa razão.

Portanto, na maioria dos casos, um tratamento é iniciado já com mais de um ano de adoecimento. Isto se o paciente não apresentar a resistência natural ao tratamento (por não ter consciência de sua doença) ou se a família adiar a procura pelo psiquiatra (é muito comum a negação ou subestimação do problema ou a crença de se tratar de algo espiritual ou de uma crise existencial da adolescência).

Os primeiros cinco anos de doença são considerados um período considerado crítico, pois estudos mostram que a gravidade da doença nos cinco anos iniciais influencia o prognóstico do paciente ao longo da vida. Todavia, quanto mais eficiente o tratamento no início do quadro, maiores as chances de recuperação, com a retomada progressiva das atividades do paciente antes de adoecer.

Isso ocorre porque alterações neurofuncionais e neuroanatômicas na esquizofrenia costumam ocorrer mais neste período do que com a cronicidade da doença, como se esta fosse uma fase de maior atividade biológica.

Pesquisas demonstraram que pacientes com esquizofrenia podem apresentar declínio de funções cognitivas, como memória, atenção e capacidade executiva, que podem não ser totalmente recuperadas passada esta fase, comprometendo o potencial de recuperação do paciente no futuro. Da mesma forma, alterações anatômicas, como redução do volume do lobo frontal, do núcleo estriado e do hipocampo, ocorrem mais no inicio da doença.

O tratamento com antipsicótico, medicação indicada no tratamento da esquizofrenia, tem um efeito neuroprotetor e pode evitar a progressão da doença em sua fase inicial, mas para isso é necessário que o medicamento seja iniciado precocemente, assim que identificado o transtorno, e garantida sua regularidade de administração, essencial para uma resposta terapêutica satisfatória e para a prevenção de recidivas (leia mais sobre Intervenção Precoce).

Adesão é o termo que se usa para definir essa regularidade do tratamento. Problemas de adesão são muito comuns na esquizofrenia e envolvem diferentes motivos. Um paciente pode não aderir ao tratamento porque não se acha doente, porque a medicação causa um efeito colateral intolerável para ele ou simplesmente porque a medicação não é eficaz o suficiente para o alivio dos sintomas, não fazendo sentido para o paciente o compromisso de tomar um medicamento diariamente. O paciente pode aderir ao tratamento no início e depois interromper, por achar que está curado e que não precisa mais do medicamento, o que também configura um problema de adesão, já que o tratamento de longo prazo é fundamental para o controle da doença, para a prevenção de recaídas e para a recuperação do paciente.

Problemas de não-adesão costumam estar presentes nos quadros mais graves ou de pior evolução, sendo um dos principais fatores relacionados ao conceito de resistência ou refratariedade ao tratamento (esquizofrenia refratária). Por isso a importância de se identificar precocemente a não adesão e tratar o paciente com medicamentos eficazes, mais toleráveis e que possam ser mais eficientes num tratamento a longo prazo, reduzindo assim os riscos de interrupção.

Os efeitos colaterais que mais comprometem a adesão ao tratamento são os efeitos extrapiramidais (do tipo parkinsonismo – tremores, lenhificação motora, alteração da marcha) e os metabólicos (como ganho de peso). Os antipsicóticos de segunda geração, que surgiram na década de 90, costumam ser opções mais eficientes do que os de primeira geração por causarem menos efeitos extrapiramidais e, entre eles, existem alternativas com melhor perfil metabólico e que causam menos ganho de peso.

Em dezembro de 2011 foi lançado no Brasil o primeiro antipsicótico de segunda geração injetável de longa duração e de uso mensal, o Palmitato de Paliperidona (Invega Sustenna). Até então só existiam antipsicóticos injetáveis (depósito) de primeira geração (Haldol Decanoato, Piportil L4, Flufenan Depot e Clopixol Depot) e um de segunda geração de uso quinzenal (Risperdal Consta).

Invega Sustenna representa um avanço no tratamento da esquizofrenia, especialmente no caso dos pacientes com histórico ou características de não-adesão ao tratamento oral (p.ex. pacientes que se recusam a tomar remédios ou que recaem com frequência porque param de tomar a medicação). Através de injeções mensais o paciente recebe níveis regulares da medicação antipsicótica sem a necessidade de comprimidos orais. É uma opção hoje para garantir um tratamento eficaz nos casos iniciais de esquizofrenia e evitar com isso a progressão da doença.

O medicamento, embora crucial, não é a única coisa importante no tratamento inicial da esquizofrenia. Hoje se sabe que a família tem um papel tão importante quanto o tratamento medico. Pesquisas mostraram de forma consistente desde a década de 80 que o ambiente familiar pode influenciar a evolução da esquizofrenia, inclusive determinar um maior número de recaídas e hospitalizações. As atitudes familiares mais relacionadas às recaídas foram aumento da critica, hostilidade, cobranças excessivas, aumento das expectativas, superproteção e superenvolvimento afetivo (viver essencialmente para o paciente, abdicando de suas atividades).

Um estudo em 2007 comparou dois grupos de pacientes, ambos moravam com familiares com alto nível de critica, mas somente um grupo tinha adesão ao tratamento médico, ou seja, usava antipsicótico regularmente. Ao final de um ano de acompanhamento, as taxas de recaída e hospitalização foram semelhantes entre o grupo que tomava e o que não tomava medicamentos, mostrando que o ambiente familiar com alto nível de critica anula os benefícios do antipsicótico.

Portanto, a cooperação da família é tão importante quanto o tratamento médico. Esta constatação é tão robusta que a psicoeducação de família, nome que se dá ao tratamento familiar para esquizofrenia, foi considerada a modalidade de tratamento psicossocial com maior nível de evidência cientifica, fazendo parte de todos os consensos internacionais para tratamento da doença. Lamentavelmente a cobertura deste tratamento para famílias de pacientes com esquizofrenia é menor do que 20%.

As prerrogativas de um tratamento de psicoeducação de família são informar os familiares sobre a doença (por isso o nome educação) e ajudar familiares e pacientes com os problemas advindos da convivência com a doença, através da terapia de solução de problemas, que pode ser feita individualmente com cada família e o paciente ou em grupo, com várias famílias e pacientes. A terapia em grupo se mostrou mais eficaz na prevenção de recaídas, na medida em que permite a troca de experiências entre pessoas que compartilham das mesmas vivencias.

A psicoeducação de família não só ajuda a prevenir recaídas, como também melhora a adesão ao tratamento médico, combate o estigma da doença entre familiares e pacientes, amplia a rede social dessas pessoas, melhora a qualidade de vida e auxilia na recuperação do paciente, inclusive na retomada de suas atividades (leia mais sobre prevenção de recaídas).

Portanto, respondendo a pergunta do titulo deste artigo, o melhor tratamento para a esquizofrenia é aquele que alia, desde o inicio, o tratamento médico, com um antipsicótico eficiente e que possa garantir a adesão do paciente, e a psicoeducação de família. Quanto antes começar esses tratamentos, menor a gravidade da doença e maiores as chances de recuperação (leia mais sobre recuperação).

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